CASTELO BRANCO
---
Enfermeira Manuela, Laura já chegou.
---
Obrigada.
Manuela
olhou o seu relogio de pulso … que dia duro … não parara um só
momento … nem se deu conta de que eram 22 horas e que já terminara
o seu turno de trabalho.
A
sua companheira Laura já estava preparada para a substituição.
Abriu
o seu armario pessoal e tirou un casaco comprido … vestiu-o mesmo
por de cima da bata branca.
Sentia
uma verdadeira vocação pela sua profissão … era enfermeira, mas,
não uma simples enfermeira … era parteira … ajudava a nascer os
futuros homens e mulheres de amanhã.
Ao
sair respirou o ar frio da noite … siempre fazia vento na entrada
do velho hospital … já se falava que muito em breve começariam as
obras de um novo e grande edificio e que depois tudo e todos sairiam
daí.
Olhou
à sua volta, a rua parecia deserta, a iluminação não era grande
coisa … tinha o museo Proença Junior mesmo de frente.
Vivia
numa das ruas por detras da Sé Catedral … sempre regressava a casa
a pé.
Àquela
hora o grande jardim estava fechado, mas tinha quase mais iluminação
que a propria rua.
Manuela
não se considerava uma pessoa medrosa … mas o regresso do turno da
noite … sempre lhe impunha respeito.
De
repente alguém a segurou por um braço.
---
Não grite. Ninguem lhe vai fazer mal.
Parou
e deu meia volta. Era só uma pessoa … un homem … alto …
delgado … vestia de uma maneira rara … mas estava muito escuro
para ver detalhes …
---
Sei que a senhora é parteira … a minha mulher esta de parto …
necessito a sua ajuda.
---
Porque não a leva ao hospital?
---
Não posso … uma historia demasiado comprida … venha por favor …
prometo pagar-lhe.
Manuela
estava paralizada com a surpresa … não sabia o que fazer …
---
Por favor …
---
Está bem. Ajudarei a sua mulher.
---
Muito obrigado … venha …
O
homem meteu dois dedos na boca e assobiou. Da zona dos arcos
apareceram dois homens, um deles parecia ter já alguns anos.
---
Venham … ela vai ajudar-nos.
Rapidamente
juntaram-se a eles … Manuela seguia meio anestesiada pela situação.
Inesperadamente
tudo ficou ainda mais negro … um dos homens le meteu um saco de
pano pela cabeça.
---
Desculpe … é para segurança de todos.
Sentiu
que le faziam dar algunas voltas, como um peão … depois com um
desconhecido de cada lado caminharam uns 15 minutos.
Ouviu
o som de um portão de ferro que se abria … começaram a descer
umas escadas … muitas escadas … desceram quase mais tempo do que
tinham caminhado.
Depois
tiraram-lhe o saco … pensou que a luz lhe iria ferir os olhos …
mas não …
Olhou
à sua volta … o ambiente era diferente de tudo o que já tinha
visto na sua vida.
A
rua era escura, diria que humida, estava quase deserta. Uma porta
abriu-se mesmo por detras de donde se encontravam.
---
Venham … já começaram as contracções …
O
seu sentido profisional ganhou vida.
---
Venha enfermeira … aqui encontrará tudo o que necesita.
Ao
passar a porta tudo se transformou. Uma luz normal iluminava uma sala
espaçosa. No meio uma cadeira especial para partos tinha uma mulher
sentada.
Tirou
o casaco e avaliou a situação.
---
Olá … tem calma … estou aqui … tudo vai ir muito bem … como
te sentes?
A
mulher, jovem de uns trinta anos, tentou sorrir … mas pela sua cara
se via que estava sofrendo.
Passou
os olhos pela sala, viu armarios e notou que estavam cheios de caixas
de medicamentos …
---
Necesito uma pessoa que me ajude … mulher de preferencia.
Imediatamente
se abriu uma porta e entrou uma mulher, mais jovem que a parturiente.
Trazia
uma bacia com agua fumegante.
---
Diga-me tudo o que precisa, senhora … estou aqui para ajudar.
Cerca
de hora e meia depois tudo tinha terminado.
Manuela
tinha nas mãos uma menina recem-nascida de perfeita saude e, na sua
frente, uma mãe totalmente exausta mas feliz.
Alertados
pelo choro da bébé, entraram alguns homens e mulheres.
Manuela
lavava as mãos e tirava a bata ensanguentada.
---
No se preocupe pela bata, temos umas novas para si, penso que lhe
serviram.
---
Donde estamos?
---
Por favor, não faça preguntas … melhor para todos.
Um
homem, com um fato antigo, aproximou-se com um grande sorriso …
---
Não imagina como lhe estamos agradecidos. Temos uma parteira mas
esta doente e tivemos que recorrer à senhora. Lamento se a
assustamos.
La
alegria na sala era evidente.
---
João. Leva a senhora à superficie.
Manuela
não compreendeu … superficie?!!!
Um
dos homens entregou-lhe uma pequena maleta. Abriu-a … dentro
estavam umas tres batas brancas, um estetoscopio y caixas de
medicamentos.
---
Isto não é meu.
---
Agora sim … é uma pequena lembrança pelo muito que ajudou a
familia de João a crescer. O nosso muito obrigado.
Acompanharam-na
à saida. Então reparou que a rua era interior, por isso não sentia
o vento … caminharam um par de metros …
---
Enfermeira Manuela … peço perdão … mas terei que voltar a
por-lhe o saco na cabeça.
---
Está bem.
A
subida das compridas escadas pareceu-lhe interminavel.
Mal
se deu conta, Manuela entrava em casa.
---
Querida … estava preocupado … estás bem?
Manuela
olhou o marido …
---
Estou bem … já te conto …
Olhou
o relogio do quarto, marcava as duas horas da madrugada.
Durante
casi uma hora contou ao seu marido tudo o que lhe havia passado.
Ele
escutou-a com um ar entre a incredulidade e o espanto.
No
final, como ele se mantivesse silencioso ela colocou a maleta que lhe
tinham oferecido em cima da cama.
Foi
tirando tudo o que havia dentro … os medicamentos … as batas …
e, no fundo … uma pequena bolsa.
Foi
o seu marido quem a tirou e abriu. De dentro cairam umas 20 moedas
amarelas … Manuela pegou numa e olhou-a atentamente …
---
E que é isto? Não são escudos …
---
Não … Manuela … isto são moedas de … ouro …
---
Ouro?
---
Sim … vinte moedas de ouro …
Uma
pequena fortuna que lhe tinham dado … os habitantes do subsolo …
Dramatizei
esta historia baseado num relato incrivel que recolhi no fascinante
livro: Contos mitos e Lendas da Beira de Jose Carlos Duarte Moura,
pag, 11.
Se
identifica no relato da enfermeira parteira, que o Hospital
ainda funcionava nas dependencias do que é hoje a Santa Casa de
Misericordia.
A
enfermeira e o seu marido, que não são identificados no relato,
fizeram muitas tentativas de encontrar a entrada para esse mundo no
subsolo … sempre sem resultados.
Não
é a única historia que em Castelo Branco fala de uma
sociedade paralela … no entanto, a minha experiencia de
investigador leva-me a concluir que existem este tipo de historias em
quase todas as cidades em todo o mundo.
BLOG DE jorge peres e carlos campos
outros blogs do autor: